Uma viagem ao centro da Terra em Tulum

Quando decidimos visitar Tulum tinhamos 3 objectivos: as ruínas, as praias e os cenotes. As ruínas maias e as praias sao as atraccoes primordiais da regiao mas os cenotes tem conquistado cada vez mais visitantes.


Um cenote é uma cavidade no calcário, permitindo aceder a um enorme sistema cársico com grutas horizontais e verticais onde existem formacoes de pormenor como estalactites e estalagmites inundadas por água. 

Os cenotes do Iucatao estao cheios de água doce pois este sistema cársico está completamente ocupado por rios subterraneos que há milhoes de anos descobriram um caminho para o mar. O colapso superficial de algumas destas cavidades sao os cenotes.


Há 100 milhoes de anos atrás a Península do Iucatao era um imenso recife de coral muito semelhante ao que se encontra hoje em frente à costa. Durante este período toda a área estava imersa em água. No entanto, há cerca de 80 milhoes de anos, a peninsula comecou a emergir devido à descida das águas do oceano. Os rios comecaram a criar um caminho subterraneo em direccao ao mar e durante este processo, devido à precipitacao do carbonato de cálcio, formaram-se inúmeras estalactites e estalagmites nas cavidades. Devido a um acelerar do processo de dissolucao as cavidades foram-se tornando cada vez maiores. Estas formacoes foram crescendo ao longo de milhares de anos e o relevo subterraneo do Iucatao foi-se desenhando. Com a última glaciacao, o nível médio das águas do mar baixou ainda mais e as cavidades, nalguns casos, atingiram mais de 100m de profundidade. As temperaturas à superfície eram praticamente insuportáveis e os animais procuraram refúgio nestes locais.


Com o final da glaciacao, há cerca de 10 mil anos, o nível médio das águas do mar voltou a subir e os cenotes foram inundados por água salgada na base. Por cima circula água doce, os rios subterraneos que continuavam a circular por baixo da peninsula. Estas duas águas nao se misturam devido à sua diferenca de densidade. Com a subida das águas, as formacoes calcarias que ficaram inundadas deixaram de crescer (quando uma estalactite toca na água o processo de formacao termina) e muitos dos animais que procuraram aqui abrigo acabaram por morrer. Foram recuperadas várias ossadas de animais extintos em vários cenotes, inclusive em Dos Ojos, um dos que visitamos. Nao é claro ainda se estes animais foram mortos devido à subida das águas ou se já estariam mortos, possivelmente devido ao frio, quando tal aconteceu.


Actualmente, os rios subterraneos continuam a drenar a água em direccao ao mar, escoando entre grutas completamente ou parcialmente inundadas. Esta água contacta de forma impressionante com a água salgada. No cenote Angellita, um cenote vertical próximo de Tulum, existe água doce até aproximadamente 18m de profundidade. A partir daí, existe uma área de um ou dois metros onde a água se mistura com a água salgada, é a chamada nuvem, e daí para baixo entra-se na água salgada onde existem inclusive várias espécies de peixes. Outro dos cenotes verticais mais famosos da peninsula é o Pit, onde a cavidade vertical atinge cerca de 100 metros de profundidade. Tanto num como noutro é possível fazer mergulho, no entanto, para mergulhar no segundo é necessário ser Advanced Dive, algo que nós nao somos. 


Apesar da maioria das agencias de viagens em Tulum nao exigirem o curso PADI- Open Waters aos mergulhadores, a verdade é que este é mais do que necessário para mergulhar em cavernas. Mais do que isso, um mergulhador deverá ter consciencia dos riscos que enfrenta num cenote e dominar a flutuabilidade neutra. A principal diferenca entre mergulhar numa gruta ou no mar é que o curso Open Water dá-nos formacao para em qualquer situacao de risco ascender verticalmente em seguranca. O mergulho em grutas nao permite tal ascensao, em primeiro lugar porque a maioria dos cenotes sao grutas horizontais onde a progressao dos mergulhadores se faz em cavidades fechadas, em segundo lugar porque salvo pouquissimas excepcoes o mergulhador nao tem ar no cimo da cavidade onde está a progredir. 


Depois de ler o manual PADI, que recomenda nao mergulhar em cavernas sem formacao, mesmo em mergulhos guiados, ponderamos os riscos a que nos iriamos sujeitar e optamos por nao fazer o mergulho, mas sim snorkeling nestas maravilhas da natureza.


Hoje existem mais de 3000 cenotes espalhados pela peninsula do Iucatao e nós escolhemos conhecer dois próximnos de Tulum, o Grande Cenote (a apenas 8 km da cidade, distancia que percorremos de bicicleta) e o cenote Dos Ojos (mais afastado e que por isso tivemos que arranjar um tour). Ambos tem cavidades horizontais onde é possível entrar por alguns metros pois há ar no topo da gruta. O Grande Cenote tem apenas uma abertura exterior, ao contrário do Dos Ojos que tem duas aberturas (daí o seu nome) e que permite passar através do rio subterraneo que corre nas cavidades de um Ojo para outro. Os dois cenotes sao fantásticos e merecem uma visita mesmo para quem nao tenciona mergulhar ou fazer snorkeling. Um bom banho nas águas frescas e doces do cenote é como uma lufada de ar fresco no calor do Iucatao. 


A decisao de nao mergulhar nos cenotes foi feita de forma bastante consciente. Ainda hoje nao sei se foi uma decisao acertada, mas na altura pareceu-me o mais adequado. Tenciono ter mais experiencia e controlar melhor a minha flutuabilidade e um dia voltar aqui. Esta era uma das coisas que mais queria fazer em Tulum e, embora me tenha divertido e conhecido imenso com o snorkeling, confesso que senti que faltou qualquer coisa.    


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